Saiba como a liberdade de expressão beneficia o ambiente corporativo

Artigo reflete sobre liberdade, escuta e integridade como impulsionadores no meio institucional

  • 17/06/2025
  • Leonardo Corrêa
  • Artigo

A liberdade de expressão não é um obstáculo à boa governança — é seu termômetro e sua cláusula de integridade. Mas quando se confunde liberdade com licença e neutralidade com omissão, o risco institucional se instala.

Em ambientes de governança, a liberdade de expressão costuma ser vista como um ativo intangível: todos reconhecem seu valor, poucos sabem como protegê-la, e muitos hesitam diante de seu uso pleno. Não deveria ser assim. A liberdade de expressão é uma das formas mais sofisticadas de controle institucional. Ela permite que verdades desconfortáveis emerjam, que riscos ocultos se revelem e que estruturas de poder sejam testadas não apenas pela forma, mas pela substância.

Mas essa função crítica só se realiza plenamente quando a cultura institucional reconhece que o dissenso não é um ruído a ser contido, e sim uma voz a ser ouvida. O desafio nas corporações começa quando se exige neutralidade de pessoas, organizações e instituições que deveriam, em verdade, ser normativas — no sentido de afirmarem princípios. Neutralidade, quando confundida com omissão, gera silêncio. É essa “neutralidade omissiva” que mina a legitimidade de muitos conselhos. Uma matéria do Brazil Journal aponta, por exemplo, que o verdadeiro papel do board não é evitar posicionamentos, mas sustentar decisões com responsabilidade, mesmo diante de tensões. Conselhos que se furtam ao debate renunciam ao seu papel institucional. E o silêncio é um dos terrenos mais férteis para o conflito de interesses prosperar. Governança não é imparcialidade cega; é a coragem de reconhecer dilemas e enfrentá-los com transparência.

Esse raciocínio não é teórico. Como ressaltado na matéria, há uma crescente valorização de conselhos que acolhem a pluralidade de perspectivas e resistem à homogeneização das decisões. Um gestor citado na reportagem resume bem essa ideia: “Um bom board não precisa de um ‘yes man’, e sim de gente com estofo financeiro e repertório de vida, gente que tem força para dizer a verdade porque está ca@#ndo para a remuneração.” Conselhos eficazes são, portanto, aqueles onde há espaço institucionalizado para o incômodo — não como ameaça, mas como contribuição.

Nenhuma organização íntegra ignora a existência de conflitos — e os ambientes de alta governança não se distinguem por evitá-los, mas pela forma como os tratam. A crítica legítima, o contraditório e a discordância fundamentada devem ter lugar assegurado nas instâncias decisórias. Quando canalizada por códigos claros e por uma cultura institucional robusta, a liberdade de expressão não apenas convive com a governança: ela a fortalece. É nessa exposição responsável que se preserva o oxigênio da integridade.

Não se trata, evidentemente, de permitir a instrumentalização da fala para ataques pessoais, mentiras ou retórica vazia. Liberdade de expressão não é licença para a destruição reputacional alheia. Mas esse risco não pode servir de pretexto para a censura preventiva, muito menos para a punição de vozes dissonantes que atuam dentro dos marcos da boa-fé. E se a boa-fé há de ter substância — e não apenas forma — talvez devamos retomá-la como expressão concreta de virtudes, como propõe Deirdre McCloskey em The Bourgeois Virtues: Ethics for an Age of Commerce: prudência, justiça, temperança, coragem, amor, fé e esperança. Essas sete virtudes, longe de abstrações devocionais, oferecem um alicerce ético robusto para a conduta institucional em ambientes de governança. Entre o silêncio e a gritaria, existe o espaço da crítica fundamentada — e esse espaço precisa ser protegido institucionalmente.

As maiores crises de governança dos últimos anos não brotaram da divergência aberta, mas do abafamento de alertas ignorados. Escândalos, colapsos reputacionais e desvios éticos muitas vezes teriam sido evitados se houvesse, desde o início, espaço real para escuta institucional. A liberdade de expressão responsável, nesse contexto, funciona como uma auditoria ética antecipada. É hora, portanto, de abandonar o pressuposto tácito de que o silêncio evita conflitos — quando, na verdade, apenas os adia e aprofunda. O incômodo precisa ser reconhecido como sinal de compromisso, e a crítica, como expressão de saúde institucional.

A governança, afinal, é construída no tempo — mas pode ser perdida num instante, sobretudo quando a liberdade é tratada como um risco a ser contido, e não como um valor a ser cultivado. É preciso que os agentes de governança repensem o lugar da crítica fundamentada: não como risco, mas como ferramenta de fortalecimento institucional. O debate contemporâneo sobre o que constitui um bom board passa por essa abertura. Cultivar uma cultura institucional capaz de escutar vozes altas, sem medo do incômodo que causam, é talvez o passo mais decisivo para uma governança que perdure.

*Leonardo Corrêa é advogado, LL.M pela Universidade da Pensilvânia, sócio da 3C LAW | Corrêa & Conforti Advogados e um dos fundadores e presidente da Lexum.

Este artigo é de responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do IBGC.

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